Saber envelhecer… desde novo. Versão para impressão
Diário do Nuno
Escrito por Nuno Frazão   
Domingo, 10 Fevereiro 2013 21:52

Quando em 2007 rumei a Budapeste, para 3 meses de formação no âmbito do ensino da Esgrima na Semmelweis University, Institute of Coaching and Sport Education, estava convicto que iria ter contacto com uma realidade formativa de profissionais de desporto muito diferente da do nosso país.

 

Esta convicção confirmou-se e excedeu mesmo as minhas melhores espectativas tocando áreas pelas quais não tinha passado na minha formação Universitária, também ela no âmbito do ensino do desporto.

Em especial tocou-me a preocupação com que os Húngaros abordam, na formação dos seus jovens técnicos, a preservação física do profissional de desporto, tendo em vista a sua longevidade e o exercício da sua profissão em idades avançadas sem prejuízo da qualidade do seu desempenho, ainda para mais numa modalidade como a Esgrima onde o treinador tem no treino diário uma prestação física extremamente exigente.

Para além de uma abordagem transversal do tema em todas as disciplinas que compunham o curso, as técnicas específicas do treinador, com vista à preservação da sua saúde, ocuparam grande parte da disciplina – Coach in action. Uma disciplina que refletia sobre toda a ação do Treinador, com especial incidência naqueles aspetos que, não vindo nos livros, é a prática ao longo dos anos que nos costuma ensinar, muitas das vezes com “erros” caros e evitáveis.

Quando somos novos, o futuro raramente nos preocupa, de tão distante que nos parece estar. O presente que vivemos encerra em si um curto intervalo de tempo e, nele, apenas conhecemos os “novos” e os “velhos” passando-nos ao lado que, os segundos, ainda há pouco tempo pertenciam ao grupo dos primeiros (esse pouco tempo é que não nos foi visível).

Embora pensado estar mais ao menos preparado para o passar dos anos, os últimos 8/10 anos trouxeram-me esta “novidade” de ter uma outra consciência do tal “tempo” que falei no paragrafo anterior e que leva os tais “novos” para mais “velhos”. Se até aos 30, também o meu Mundo era feito de “novos” e “velhos”, a última década colocou-me em contacto com “velhos”, que eu vi “novos”.

(quando falo em “velhos” nem sempre me refiro a idades respeitosamente avançadas. No panorama desportivo, os “velhos” são habitualmente jovens ou pessoas de meia idade que acabaram a sua carreira de alta-competição)

Antes do fenómeno do Chinês, pouca gente destas gerações dos meus alunos sabia quem era o Paulo Futre. Mas eu vi-o jogar nos Juvenis do Sporting nos inúmeros fins-de-semana vividos em Alvalade com o meu Pai.

Na 6ª-feira, no corta-mato do desporto escolar mostrei a alguns dos meus alunos quem era o Carlos Lopes e o que tinha feito, no entanto, o seu olhar mostrava a desconfiança que talvez estivesse a brincar ao dizer que aquele senhor um pouco fortezinho tinha sido Campeão Olímpico a correr 42,195Km. Mas eu acordei nessa madrugada para assistir em direto a essa vitória.

E como estes exemplos anteriores muitos outros poderia aqui dar nos mesmos moldes.

Mas estes são os exemplos positivos. Estes são “velhos” que souberam envelhecer dentro de uma prática desportiva de alto-rendimento que, para além da sorte sempre necessária, souberam parar ou abrandar quando assim chegou a hora, que provavelmente estiveram bem enquadrados e de alguma forma construíram o seu presente precavendo o seu futuro (e não estou a falar monetariamente).

O que me custa é ver os casos em que as coisas não correram bem. Em que para além da sorte não ter  estado lá, também os excessos de uma juventude que parecia para sempre, marcaram o futuro que chegou rapidamente.

O futebolista Argentino Gabriel Batistuta é apenas um exemplo desta situação. Contemporâneo de Rui Costa com quem formou uma dupla temível no futebol Italiano ao serviço da Fiorentina, é ainda o melhor marcador de sempre ao serviço da seleção Argentina com 56 golos marcados em 78 internacionalizações. Com 42 anos  (e nenhum acidente para além das lesões normais do futebol) Batistuta… mal consegue andar. Segundo as últimas notícias, as fortes dores no joelho originadas pelas inúmeras infiltrações realizadas ao longo da sua carreira, não lhe permitem mais do que meia hora seguida de pé.

Porque a juventude do nosso corpo não coabita com a maturidade do nosso pensamento no mesmo intervalo de tempo, é necessário, principalmente no desporto, estarmos despertos para este tema e, quer seja como atletas ou treinadores, sabermos preparar o nosso envelhecimento desde novos, tal como os Húngaros o fazem na formação dos seus Técnicos.